quinta-feira, maio 31, 2007

Vale tudo!

Acabei de ler em rodapé no Jornal da TVI que os trabalhadores da função pública podem baixar de categoria profissional com a reforma no sector. A ser verdade, nem sei como qualificar esta intenção do governo que se diz de esquerda mas que na prática continua a revelar uma enorme insensibilidade social.
Se esta medida vier a ser aplicada também no sector da educação, os professores que estão no 8º,9º e10º escalão e que não ascendam à categoria de professor titular, arriscam-se, muito provavelmente, num futuro próximo, a serem reposicionados na carreira, no último escalão da categoria de professor com a correspondente e significativa baixa salarial. Não acreditam? Pois é bom que comecem a acreditar já que este governo há muito que vem dando provas suficientes de se estar a marimbar para os direitos adquiridos dos trabalhadores. Em prol da redução do défice, estes socialistas são capazes de tudo, até de vender as mães, se for necessário.

Balanço da greve geral

Por muito que me custe dizê-lo, o facto é que a greve foi quase inexpressiva. O governo aponta para 13,7%, enquanto os sindicatos situam a adesão nos 47%. Sabendo que, nem um nem outro são de fiar, nada como fazer a média dos dois para termos um valor mais consentâneo com a realidade. Teremos então um número na casa dos 23%. Ora este valor fica aquém das minhas próprias expectativas. Embora soubesse que a adesão não seria significativa, confesso que esperava mais.
Algumas explicações para este insucesso:
- o recurso à greve deixou de ter o impacto de antigamente: banalizaram-se e, por isso, caíram em descrédito;
- a UGT ter ficado de fora desta luta;
- a campanha de intimidação do governo;
- os trabalhadores precários que não sabem o que é ter direitos e não se podem dar ao luxo de fazerem greve com medo das represálias por parte do patronato;
- os baixos vencimentos praticados que impedem que muitos agregados familiares não possam prescindir do ordenado de 1 dia.

Apesar destes fracos resultados seria conveniente que Sócrates não cantasse vitória, pois há cada vez mais gente farta desta desumana governação que nos consome diariamente. O facto de 77% dos trabalhadores não ter feito greve não significa que todos eles estejam a favor das políticas deste governo. A arrogância, a intolerância e a insensibilidade para com os mais desfavorecidos vai ter o seu preço. Já esteve mais longe!

quarta-feira, maio 30, 2007

terça-feira, maio 29, 2007

Erros de ortografia não contam para avaliação

O Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE) do Ministério da Educação deu ordens para que nas primeiras partes das provas de aferição de Língua Portuguesa do 4.º e 6.º anos, os erros de construção gráfica, grafia ou de uso de convenções gráficas não fossem considerados.
Ficamos assim a saber que a tutela não considera importante que as nossas criancinhas saibam escrever português de forma correcta. Será que isto promove a aprendizagem da nossa língua? Seguramente que não. Eu que sou do tempo em que um erro ortográfico dava direito a uma reguada, estranho tamanho desleixo. Perante a evidência de os portugueses revelarem grandes dificuldades no domínio da língua materna tenho dificuldade em admitir uma decisão desta natureza, embora entenda a sua aplicação. O objectivo é simples e claro: permitir que as classificações subam. Mais uma vez, a obsessão pelas estatísticas a sobrepor-se a tudo o resto.

segunda-feira, maio 28, 2007

Pergunta pertinente

A responsável da DREN teria recorrido ao mesmo procedimento disciplinar caso o funcionário fosse da sua cor política? Aceitam-se palpites.

Procedimento disciplinar

"Sim, todos nós sabemos que o regime não cai por causa de uma directora regional da educação, por muitos bons acessos que ela possa ter junto do governo. O "caso Charrua" não pode ser tratado como uma tragédia; mas deve ser considerado um epifenómeno, um exemplo e um perigo. Independentemente dos resultados do "procedimento disciplinar" a que a Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) sujeitou o professor, há matéria para pensarmos no assunto.Em primeiro lugar, dadas as circunstâncias, os resultados do inquérito devem ser tornados públicos na sua totalidade. A actual situação de "segredo disciplinar" tem permitido todo o género de suspeitas sobre o caso. O tipo de castigo aplicado, o modo de funcionamento da DREN (que neste caso se baseou na delação, na suspeita, na denúncia de situações de corredor, na perseguição política) e a reacção de responsáveis políticos do PS não auguram nada de bom. Além do mais, é suspeito e muito estranho que Alberto Martins (líder da bancada parlamentar do PS), por exemplo, tenha ficado calado durante o debate da AR. Ele, que defendeu a liberdade no regime anterior.Para recordar aos leitores mais distraídos, o JN publicou na semana passada uma reacção de Renato Sampaio, em que este líder do PS-Porto achava o procedimento "absolutamente normal". De igual modo, o coordenador dos deputados do PS na área da Educação achava que era "preciso fazer qualquer coisa quando os políticos são achincalhados na rua"e, nessa medida, não comentaria "processos disciplinares". Esta posição comum a duas pobres almas que tentam agradar a quem promove inquéritos disciplinares tão obtusos, dá uma ideia do que pode acontecer a quem for, um dia, perseguido pelo poder político. Parece que não aprendemos nada com a história da censura, da arbitrariedade, da denúncia inquisitorial e da perseguição à liberdade de expressão. A estes cavalheiros não pediremos, certamente, ajuda nenhuma.O caso parece dar r azão ao velho "precaucionismo" português e à vantagem de estar caladinho e com juízo, ambas as coisas herdadas do salazarismo e do passado inquisitorial. Melhor que não desconfiem, melhor que não oiçam, melhor que não se achincalhe ninguém - com uma piada, uma graçola, uma anedota, uma alusão. Teriam assim razão aqueles que acham que "o perigo espreita" em cada palavra, sobretudo se ela pode ser escutada por funcionários que podem denunciar, delatar ou, pura e simplesmente, vingar-se. Casos destes ocorrem frequentemente, mas a vantagem das democracias é que são denunciados à opinião pública e os seus responsáveis afastados e, nunca, defendidos - a não ser por pobres almas que acham tudo "absolutamente normal" ou temem que se "achincalhem" políticos na rua. Por que razão não devem ser defendidos esses procedimentos? Justamente, porque põem em perigo um dos pilares fundamentais das democracias liberais, que é o direito a não ser perseguido por delitos de opinião ou por motivos políticos.Se a ministra da Educação, por quem tenho o maior respeito, o governo e o PS não se demarcam da decisão e dos métodos usados na DREN, estarão a dar um péssimo sinal aos portugueses. Não só pactuam com a actuação desastrada da directora da DREN (que, a acreditar no que vem publicado nos jornais, já publicamente fez piadas acerca da licenciatura do primeiro-ministro e estará, assim, sob a alçada de "procedimento" por ter "achincalhado" um político na rua), como incentivarão outros pequenos e medíocres ditadores de corredor a actuar com total impunidade.Só uma nota final. Deixei, na altura, escrito o que pensava sobre a trapalhada que foi Santana Lopes enquanto primeiro-ministro. Sou, portanto, insuspeito. Mas, se isto acontecesse na época, já haveria manifestações de rua e declarações parlamentares a pedir a sua demissão. Façam as contas".

Francisco José Viegas
Jornal de Notícias


quinta-feira, maio 24, 2007

Jornalismo desprezível

"É quase genético. Qualquer tentativa de avaliar professores, escolas e - cada vez mais - estudantes causa uma alergia arrepiante aos sindicatos. Liderados pela emblemática Fenprof, estão contra as aulas de substituição, o ranking das escolas, a classificação dos docentes, os exames nacionais e agora também as provas de aferição nacionais que têm como objectivo habituar os alunos mais novos a uma cultura de exigência e perceber quais são os liceus onde se aprende a matéria dada.
Tudo isto causa uma náusea à Fenprof. Exigência é uma palavra que deveria ser banida do dicionário e aprender é secundário - o importante é ensinar.
As provas de aferição dos alunos do 4º e 6º anos - que não têm peso na nota final - não são um simples capricho da ministra da Educação. São uma fase de transição para os exames nacionais, uma forma de exigir conhecimentos dos alunos de forma rigorosa, uma maneira de responsabilizar os professores e as escolas pelas notas dos estudantes.
Quem "rejeita e repudia" tudo isto, tal como a Frenprof, só pode ainda não ter percebido qual a importância da escola e do seu papel no sistema de ensino. Perante a exigência e a responsabilidade, os sindicatos têm receio. Receio de estarem a ser avaliados, receio de trabalharem mais, receio de serem responsabilizados pelas notas dos estudantes. No fundo, receio de serem julgados por terem conseguido, ou não, que os alunos aprendessem.
Para a Fenpfrof, é simples: cada escola está numa zona geográfica diferente, cada aluno tem um contexto socioeconómico distinto. Resumindo: nada se pode comparar, nada se pode avaliar. A começar pelo trabalho dos professores.
No fundo, tudo se resume a isto: a luta contra a premiação do mérito, a luta pela cultura da impunidade".
Editorial
Revista Sábado

Nota: Quando vejo esta malta da comunicação social a dissertar sobre questões da educação cada vez mais me convenço que o jornalismo em Portugal está pelas ruas da amargura. A ligeireza com que este pessoal fala sobre temas que desconhece até arrepia. Como é que se pode ajuizar e acusar quando não se sabe minimamente do que se está a falar? Será que o fazem de forma convicta ou limitam-se a reproduzir a voz de quem os comanda? O pior é que o povinho à força de tanto ouvir e ler a mesma coisa acaba por se convencer de que o que lhe transmitem é verdade. E tem esta gente a lata de vir falar em impunidade. Haja paciência!

quarta-feira, maio 23, 2007

Mais um "tiro" no Programa Novas Oportunidades

"Impressionam os números da adesão ao programa governamental Novas Oportunidades: mais de 250 mil querem certificar-se com o ensino básico e cerca de 75 mil com o secundário. E mais impressiona se recordarmos que, há escassos meses, o tema foi destaque repetido na imprensa, após inquérito de âmbito europeu, por sermos os que menor disponibilidade manifestávamos para regressar à escola e menos valorizávamos a necessidade de formação ao longo da vida. Neste quadro, faz sentido perguntar: que terá acontecido, para tão grande mudança de atitude, em tão escasso tempo?
Da multiplicidade de factores que integram uma possível resposta, destaca-se o oportunismo e a leviandade com que se procura popularizar e facilitar o que suporia trabalho acrescido e sacrifício pesado. O decoro profissional aconselha a não descrever como, em muitos centros, meia dúzia de meses, a tempo parcial, chegam para certificar o conhecimento que exige, no quadro tradicional, cinco anos de escolaridade, a tempo integral".

Santana Castilho
Público

terça-feira, maio 22, 2007

Prioridades

"Quando o nosso mundo nos parecer um caos e as 24 horas do dia já não chegarem para estabilizar a nossa vida, seria bom recordarmos esta velha história:
...Na sala de aula, o professor estava de pé com alguns objectos em cima da secretária. A aula começou…
Calado, pegou num grande frasco de vidro vazio e começou a enchê-lo com bolas de golfe. Quando já não cabiam mais bolas, perguntou aos alunos se achavam que o frasco já estava cheio….Todos responderam que sim…O professor pegou então num saco de feijões secos e, ao chocalhar o frasco, iam-se encaixando nos buracos vazios entre as bolas de golfe.
Quando já não cabiam mais feijões, perguntou aos alunos se achavam que o frasco já estava cheio…E todos responderam que sim…
Neste ponto, o professor despejou um saco de areia para dentro do frasco. Como é óbvio, a areia ocupou todo o espaço restante... Quando já não cabia mais areia, voltou a perguntar aos alunos se achavam que o frasco estava cheio. E, mais uma vez se repetiu a resposta: Sim…
O professor agarrou então em dois copos de café e despejou-os para dentro do frasco, retorquindo: - Agora sim, já não há mais espaço!!! Os alunos desataram a rir!!!
"Agora," disse o professor enquanto as gargalhadas ainda se ouviam, "quero que vocês reconheçam que este frasco representa a organização da vossa vida".- "As bolas de golfe são as coisas mais importantes: a família, os filhos, a saúde, os amigos e tudo o que vos é mais querido, de tal modo a que, se tudo na vida desaparecesse e só ficassem elas, a vossa vida continuava cheia!
- "Os feijões” são as outras coisas importantes da vida: o trabalho, a casa, o carro
- "A areia” é tudo o resto das coisinhas pequeninas.
"Se encherem primeiro o frasco com a areia, já não haverá espaço para o feijão nem para as bolas de golfe”. O mesmo se passa com a nossa vida. Se gastarem todo o tempo e a vossa energia com as pequenas coisas, nunca chegarão a ter espaço para as que são verdadeiramente importantes. Prestem muita atenção às coisas que são essenciais à vossa felicidade!
Brinquem com as crianças. Tirem tempo para ir ao médico, talvez fazer um “check-up” geral…Saiam para um jantar romântico…vai haver sempre tempo para arrumar a casa, para acabar um trabalho onde só falta um bocadinho... Em primeiro lugar, tomem bem conta das vossas “bolas de golfe”, símbolo da maior importância e tenham prioridades! Para o resto, vai haver sempre espaço…
Nunca encham em primeiro lugar o vosso frasco com a areia, porque, desta forma, as bolas de golfe não caberão no frasco….
Um aluno perguntou: - E o café o que é?!!
- Ainda bem que perguntas… ia agora mesmo dizer-vos. É que mesmo que sintam que a vossa vida está cheia, há sempre espaço para beber um café com um amigo."

As provas de aferição

Os alunos do 4º e 6º ano começaram hoje a testar os seus conhecimentos a Português e Matemática, realizando provas nacionais de aferição que não contam para nota, mas que servem, no entender da tutela, para aferir se estão a ser adquiridas as competências básicas . Confesso que lhes atribuo pouco valor dado o nulo peso que têm no percurso escolar dos alunos. Estes, sabendo que as ditas não aquecem nem arrefecem, terão tendência a encará-las de forma pouco séria e displicente o que conduzirá, inevitavelmente, a uma adulteração dos resultados. Assim sendo, até que ponto, com base nas classificações alcançadas nestas provas, se podem fazer análises credíveis relativamente à adequação das práticas lectivas? Será justo e admissível responsabilizar escolas e professores por eventuais maus resultados? Não me parece, embora me pareça também que é isso que vai suceder.

segunda-feira, maio 21, 2007

Pequena carta a José Sócrates

"Senhor primeiro-ministro eu não conheço o caso senão pelas páginas dos jornais mas sei que Fernando Charrua é um professor de Inglês requisitado pela Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) e agora suspenso por ter gracejado sobre o processo da sua licenciatura. Mais de meio país, seguramente, fez "comentários" sobre o assunto - graçolas, piadas, anedotas, coisas soezes ou apenas risíveis e imbecis. O senhor sabe. É natural, somos portugueses e conhecemos a injustiça do humor de Gil Vicente, mesmo que o assunto seja tão irritante e tão menor como esse. O tema não é tabu e o senhor mesmo foi à televisão por causa dele. A responsável pela DREN, avisada por alguém (que achou por bem denunciar o caso, sabe-se lá porquê) achou que o comentário do professor era um insulto ao primeiro-ministro e resolveu suspendê-lo de funções e instaurar-lhe um processo disciplinar, com participação - creio - ao Ministério Público. O que apurará o processo não se sabe ainda, mas prevejo um grande debate sobre o que é e não é insulto e sobre os deveres dos funcionários públicos. A coisa promete. Como em muitas situações semelhantes, vamos ter mais anedotas sobre o assunto. Ele merece. De acordo com a directora regional de Educação - é, portanto, a posição oficial do Ministério da Educação -, "o Sr. primeiro-ministro é o primeiro-ministro de Portugal" e os funcionários públicos devem-lhe respeito. Ora, nem que não fosse primeiro-ministro. Em declarações ao jornal "Público", Margarida Moreira acrescentou que a sua decisão (a de suspender o professor, a de instaurar-lhe um processo disciplinar e a de participar ao Ministério Público) se deve ao facto de "poder haver perturbação do funcionamento do serviço".Dado que o processo se encontra em fase de "segredo", uma figura jurídica que serve para tudo, não sabemos que insulto lhe terá Fernando Charrua dirigido, a si, senhor primeiro-ministro, que pudesse perturbar tão gravemente "o serviço". Imagino que o senhor também não saiba. Mas, andando na política há tantos anos, suponho que nenhum insulto lhe deva ser estranho. Basta aparecer na televisão, ter um nome e ocupar um cargo. O senhor sabe como essas coisas se passam. De tudo fazemos uma anedota. O mundo é cruel.Há, evidentemente, a hipótese de a notícia não ser totalmente verdadeira. Mas não vejo como a directora da DREN confirmou-a e o ministério da Educação não a desmentiu até hoje. Se o processo disciplinar ao professor continuar a correr neste segredo, aumentarão os rumores e as suspeitas. A principal delas, mesmo sendo injusta, é a de que o senhor autoriza o Ministério da Educação, através da DREN, a fomentar o autoritarismo, o culto da personalidade ou a perseguição política a funcionários públicos que contem anedotas sobre José Sócrates. Seja como for, acho que a directora da DREN se excedeu. Foi mais papista do que o papa e causou-lhe, a si, um problema o de poder passar a haver despedimentos por "delito de opinião", o que é muito grave. O senhor dirá que não se trata de um despedimento mas, na pobre linguagem da pequena política, já se sabe que não basta "ser" - é também necessário "parecer". Ora, isto parece, exactamente, "delito de opinião". Argumentarão alguns que o comentário foi feito "nas horas de serviço" e "nas instalações da DREN"; teria sido assim tão grave que as paredes da DREN coraram de vergonha?Sei que o senhor primeiro-ministro não concorda com este tipo de perseguições. Não deixe que isso aconteça no seu, e meu, país. De contrário, o senhor será responsável pelo reaparecimento de milhares de pequenos ditadores e papistas, um pouco por todo o lado. Eles detestam-no a si porque o senhor é de uma nova geração de políticos que nasceu para a política já em liberdade; mas aproveitarão a boleia que este caso pode dar-lhes para satisfazer a pequena tentação portuguesa da intolerância".

Francisco José Viegas

Jornal de Notícias

sábado, maio 19, 2007

Concurso para Professor Titular

O Concurso ainda não abriu mas aqui já se encontra a ficha de inscrição obrigatória. Vão estando atentos porque o concurso deve estar por aí a rebentar.

segunda-feira, maio 14, 2007

A Matemática em análise

Entrevista com João Queiró, professor do Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia de Coimbra.


Diário de Coimbra – A Matemática é daquelas áreas que as pessoas quase parecem ter orgulho em dizer que não gostam ou não percebem.
João Filipe Queiró – É um cliché associado à Matemática dizer isso. Mas eu nunca encontrei ninguém que o afirmasse explicitamente. Coisa diferente é saber se as pessoas têm grande gosto pela Matemática, ou se tiveram grande sucesso. Não acho que a Matemática tenha um lugar especial nos problemas do sistema educativo.
DC – É das disciplinas onde, todos os anos, há piores resultados.
JFQ – Mas tratar a Matemática à parte, como se fosse um assunto extraterrestre, tem o efeito de esconder que vários dos problemas que se prendem com a disciplina resultam de problemas gerais do sistema educativo. A especificidade da Matemática é ser a construção de um edifício. É o seu carácter sequencial, cumulativo.
DC – Ou seja, exige um esforço diário do aluno.
JFQ – Todas exigem, mas este carácter cumulativo é mais pronunciado na Matemática do que noutras disciplinas. Uma falha localizada, num certo capítulo da História ou da Geografia, ou de uma disciplina de Ciências Naturais, não prejudica tanto o edifício.
DC – Esse mal resulta de uma postura cultural, de evitar o que é difícil e dá trabalho, ou também se pode apontar o dedo ao ensino: aos professores?
JFQ – Há quem o diga, que é uma questão cultural, se ca-lhar até genética. Mas é especulativo ir por esse caminho. Prefiro falar de aspectos sobre os quais se poderia intervir. E eu ponho à cabeça o ambiente geral no qual a escola está imersa. A indisciplina escolar é um fenómeno grave, que todos os professores observam nas escolas portuguesas, ao qual não é dado o devido relevo, e que é tudo menos conducente a um estudo e uma aprendizagem serenas.
DC – Mas isso para todas as disciplinas.
JFQ – Eu prefiro concentrar--me nos problemas gerais, para não dizer que a Matemática é um problema específico. A indisciplina, dizia, resulta da desvalorização do conhecimento que há em Portugal. Há estudos que sugerem que os portugueses não sabem muito eque não querem saber muito. Depois, a timidez educativa em Portugal, a dúvida que já se estendeu aos próprios professores sobre o interesse disto tudo... Porquê tentar impor seja o que for? Ensinar qualquer coisa é uma imposição.
DC – Concorda com a teoria de que não se deve ser demasiado exaustivo nas avaliações, porque o estudante tem de ter gosto para aprender?
JFQ – Há que perceber que a escola, com o que significa de pôr duas ou três dezenas de jovens numa sala, com um adulto a falar de assuntos que não são da experiência directa desses jovens, tem algo de anti-natural. Uma criança “posta à solta”, se lhe derem a escolher entre um campo com uma bola, e uma sala onde vai estar sentada uma hora a ouvir um adulto, essa criança não hesita.
DC – Mas a vida é assim. As crianças têm de aprender coisas de que não gostam.
JFQ – Essa frase é chave. A vida é assim, é feita de constrangimentos, de coisas que, de vez em quando, nós fazemos contrariados. Mas há algum pensamento que, face às dificuldades escolares, acha que a questão do gosto e das tendências da criança deve prevalecer sobre o resto. O que é muito mau.
DC – Não será perverso?
JFQ – Pode ser muito perverso. Mesmo que fique na sala de aula, pode representar que a criança não aprenda. Muitas vezes, estas coisas, de dizer que o aluno deve chegar lá por si, parecem plausíveis, mas, depois, a aplicação disso na prática tem efeitos terríveis, de uma enorme dissolução de ambientes de aprendizagem. Outra dificuldade grande são os professores. Coexistem os bem formados, em boas universidades, sérias, com outros, formados por instituições que não têm os mesmos padrões. Um problema que existe, seguramente, há 20 anos em Portugal é a falta de vigilância e controlo do ensino superior. No caso dos professores, o principal empregador é o Ministério da Educação, que recruta pela nota de licenciatura. Se a faculdade de dar a nota se entrega a ins-tituições não credíveis, isto tem os efeitos que se pode imaginar e que aconteceram. Ao longo dos anos 90, e princípios já desta década, o Estado contratou muitos professores com uma formação deficiente.
DC – Daí que se venha, agora, propor um exame de acesso à carreira.
JFQ – Não só. Também esta agência de acreditação e avaliação do ensino superior, que vem regular a qualidade de todos os cursos.
DC – Mas deve, ou não, apontar-se o dedo ao ensino, pelo insucesso na Matemática?
JFQ – Há más orientações nos programas e nas metodologias para os cumprir. Um constituinte essencial da Matemática é o rigor: do raciocínio, da prova, da dedução. E isso tem sido progressivamente desvalorizado, o que tem um efeito dissolvente, porque a Matemática não é uma lista de factos desconexos.
DC – Por a Matemática ser assim, não se justificaria torná-la obrigatória em todos os currículos escolares e não apenas nos ramos ditos científicos?
JFQ – Essa pergunta leva a uma questão política muito difícil: de saber quais são as disciplinas que todos devem estudar e até onde. Isto tem provocado enormes tensões no sistema educativo português. Há quem sustente que no secundário toda a gente deve ter Matemática. E há quem ache que isso má ideia, até porque há muitos alunos que escolhem a sua via pelo simples facto de não haver lá Matemática.
DC – Não faria sentido, por isso mesmo, insistir na disciplina até ao final do secundário? Para que as escolhas no ensino superior não fossem de recurso e dessem mais saídas profissionais.
JFQ – Há uma quebra global nacional de procura dos cursos de ciências e engenharias, porque a base de recrutamento para esses cursos é, normalmente, a Matemática, a Física e a Química. Há instituições de ensino superior em Portugal, que, por causa disto, retiram a Matemática das disciplinas de acesso. De novo, Estado e governos vêem a situação e não fazem nada. Isto anda ao deus--dará, para ver quem é o mais esperto. Quem sai prejudicado, em primeiro lugar, é o país. Em segundo, as instituições que tentam ser sérias.


Entrevista publicada no Diário de Coimbra

sexta-feira, maio 11, 2007

O Plano de Acção para a Matemática

Maria de Lurdes afirma que o balanço do funcionamento do Plano de Acção para a Matemática é “muito positivo” ainda que, segundo ela, os exames deste ano sejam o momento ideal para dissipar dúvidas quanto à sua eficácia.
Não sei porquê tenho um leve pressentimento que os resultados vão ser melhores do que foram no ano transacto. Não porque os alunos tenham adquirido mais competências matemáticas mas antes porque o grau de dificuldade dos exames vai ser bem menos exigente. De qualquer forma, precavendo-se, a ministra já vai dizendo que caso os resultados não sofram uma evolução positiva a culpa deverá ser atribuída às escolas e aos professores. Ficamos assim a saber que bastam apenas meia dúzia de meses de implementação do dito Plano para que a “socióloga” consiga ver os rostos do eventual fracasso. Fantástico!

terça-feira, maio 08, 2007

As eleições para os Conselhos Executivos

Por estes dias, as eleições para os Conselhos Executivos vão-se suceder por esse país fora. Na minha escola, à semelhança de tantas outras (provavelmente a maioria), a escolha será limitada a uma única lista, constituída pelos elementos da actual gestão. Quer isto dizer que os mesmos irão manter-se no poder por falta de outros interessados em gerir os destinos da escola.
Apesar do excesso de afazeres, do stress acumulado, da falta de reconhecimento pelo trabalho desenvolvido, e de outras contrariedades que os levam constantemente a amaldiçoar o dia em que se candidataram, o que é certo é que quando chega a altura de se poderem afastar, esta malta, por norma, recandidata-se. Um gesto de profundo masoquismo que muitos anos de docência ainda não conseguiram perceber

Sondagem

sexta-feira, maio 04, 2007

Antes e depois

O texto que se segue, é absolutamente demolidor e revelador da hipocrisia e da falta de escrúpulos de que padece a nossa classe política:


"Um dos elementos fundamentais da retórica do primeiro-ministro é que "antes" não se fazia nada, não se decidia nada, a oposição defendia sempre o contrário de hoje; "agora" decide-se tudo, faz-se tudo, sempre com um "rumo" certo e seguro que o PS sempre teve. Quando ouço isto, só há uma pergunta que acho que deveria ser obrigatório fazer: naquele preciso momento do "antes" quais eram as posições que o PS e José Sócrates defendiam sobre a matéria respectiva? Para se reconstruir honestamente o mundo do "antes" é vital saber o que é que eles defendiam "antes". E aqui a resposta é simples: o PS e José Sócrates defendiam o contrário de "agora", sendo que o "agora" é muito mais parecido com o que os outros defendiam "antes". "Antes" era a "obsessão do défice", "agora" é o "rigor orçamental"; "antes" era o "discurso da tanga", "agora" é "um momento muito difícil"; "antes" era colocar os números antes das pessoas, "agora" é a irresponsabilidade de colocar as pessoas antes dos números, na saúde, na segurança social, na administração pública. Esta retórica política é uma das coisas que mais desprestigiam a política em democracia. PSD e PS pagam um preço significativo por essa retórica, mas o actual primeiro-ministro é de uma desfaçatez acima do comum nesta forma de mentira".

Pacheco Pereira
Revista "Sábado"

quinta-feira, maio 03, 2007

RAP no HQMC

Ricardo Araújo Pereira em início de carreira quando ainda não sonhava com os Gato Fedorento. De chorar a rir!

quarta-feira, maio 02, 2007

O Programa Novas Oportunidades

Segundo dados hoje apresentados pelos ministros do Trabalho e da Segurança Social e da Educação, o Programa Novas Oportunidades tem tido uma assinalável procura. 250.774 aderiram a este Programa, sendo que 176.176 para concluir a sua formação ao nível do ensino básico e 74.598 para terminar a sua formação ao nível do ensino secundário.

Sobre este tema convém ler este testemunho:

“A minha mãe de 48 anos obteve desta forma a equivalência ao 9º ano: inscreveu-se num Centro de validação; elaborou um portfólio sobre o seu percurso de vida (com fotografias minhas e dos meus irmãos incluídas!); teve 5 aulas com um professor de português; escreveu um pequeno texto de 2 folhas A4 sobre cidadania a partir da leitura de uns textos disponibilizados; aprendeu a enviar e receber mails, e resolveu em casa uma ficha de exercícios de matemática e aritmética (que foi resolvida pelos filhos). Resultado? Em 4 meses passou do 5º ano ao 9º, com certificado e tudo. Aprendeu algo novo? Tornou-se mais competente? Tem mais sabedoria? Tem conhecimentos, ainda que parcos, das matérias ao nível do 9º ano? Nenhumas! Mas na estatística já consta! Novas Oportunidades? Sim, para os donos do Centro de validação! O povo continua inculto como sempre....Santa ilusão!”

Como este exemplo haverá milhares. Eu próprio conheço alguns casos. Uma coisa é certa: com todo este facilitismo, dentro de pouco anos seremos imbatíveis nas estatísticas internacionais em matéria de sucesso escolar. Mesmo que isso não signifique um acréscimo de qualidade na qualificação das pessoas. Mas desde quando está José Sócrates preocupado com tão mísero pormenor?!

O Postal de José Sócrates

Ouçam que vale a pena.

terça-feira, maio 01, 2007

PGR cumpre a sua obrigação

A PGR vai mandar abrir uma investigação à Universidade Independente. Em princípio trata-se de uma boa notícia, isto se a investigação não se centrar exclusivamente nas irregularidades da UNI, mas também no percurso escolar do 1º ministro naquele estabelecimento de ensino que é aquilo que os portugueses, acima de tudo, desejam ver clarificado. Se for apenas uma manobra de diversão para enganar papalvos mais vale ficarem quietos. É que as suspeitas de que não vamos ter uma investigação séria, independente e imparcial, são muitas, pois fica a ideia de que ela só avança por pressão da opinião pública e não por particular interesse da PGR em ver a questão esclarecida. Veremos se o nosso sistema judicial terá a independência e a coragem suficiente para, caso isso se justifique, levar o processo até às últimas consequências. Eu tenho dúvidas, mas nada como esperar para ver.

O ensino superior

"A recente polémica em torno das habilitações do Primeiro Ministro deverá ter pelo menos o condão de relançar a discussão sobre o ensino superior em Portugal.
Parece evidente que as coisas não podem continuar como estão e que se exige um esforço sério de depuração e realinhamento do sistema.
Existe hoje um número considerável de instituições de ensino superior, entre públicas e privadas, e uma maranha incontável e por vezes indiscernível de cursos e licenciaturas.
Às licenciaturas tradicionais, cuja epistemologia e corpus conceptual e doutrinário resultam inquestionavelmente consolidados pela sua perenidade no panteão dos estudos universitários, veio somar-se um conjunto de outros cursos que, daqueles visando diferenciar-se por mor da competitividade no sector, não correspondem verdadeiramente a novas áreas do saber, justificadamente credoras de tratamento autónomo, mas muitas vezes a meras declinações bastardas dos saberes tradicionais ou aos mesmos saberes travestidos com novas roupagens.
Non nova sed nove.
Não se nega a dinâmica do conhecimento nem se pretende evidentemente regressar ao medievo trivium ou quadrivium, mas tão só alertar para a sua excessiva proliferação e, em muitos casos, ausência de densificação doutrinária.
A massificação do ensino superior – um bem se apenas submetida ao crivo estatístico –acarretou a inevitável perda de qualidade, assacável de resto aos demais graus de ensino que, também por isso, não cumprem a sua função preparatória no acesso aos patamares de ensino que lhe sobrevêm.
A escola e o saber – embora quanto este a sua aquisição se não reconduza ao ensino meramente formal – devem ser acessíveis a todos no respeito pela mais escrupulosa igualdade de oportunidades, em particular no que toca à formação qualificante de base, verdadeiro viático para vida.
Não só para o exercício de uma profissão, forma costumeira e socialmente útil de a ganhar, mas como elemento fundamental da formação integral do homem e do cidadão.
O direito ao ensino é indissociável da obrigação de aprender e esta não resiste ao facilistismo excessivo, onde deveria pontuar a exigência e o rigor, nem a pseudo pedagogias lúdico-subversivas, pois o saber e a aprendizagem são sobretudo um caminho que nunca acaba e que exige disciplina, esforço e sacrifício.
Não espanta por isso que vá declinando a qualidade média das sucessivas gerações de alunos e docentes, pois que a excelência e a mediocridade, existindo hoje e sempre, vicejarão imunes à degenerescência geral, com elas porém se não bastando o progresso e o bem comum de uma sociedade e que repousam em boa medida nas aptidões médias dos seus cidadãos.
A corrida aos cursos superiores e a proliferação de estabelecimentos de ensino, que já de si levanta delicadas questões ao nível do equilíbrio geral do mercado de trabalho desfalcado das qualificações intermédias, provocou igualmente o incremento generalizado da busca dos graus académicos pós-licenciatura, conduzindo à sua vulgarização e, destarte, à perda do seu prestígio académico e social.
Os docentes, por seu turno, vêm sendo sucessivamente tolhidos no seu labor científico, presa de um conjunto de tarefas burocráticas e de gestão que extravasam em muito o seu escopo funcional, o que, além de atentar contra os seus direitos enquanto trabalhadores, constitui um inegável desperdício de recursos e inábil mecanismo de divisão do trabalho.
A bizarra e inconstitucional privação do direito ao subsídio de desemprego, pelo menos no que tange aos docentes do ensino superior público, reforçando a precariedade do vínculo laboral convida à dispersão e ao pluriemprego, diminuindo o sentimento de pertença à instituição académica indispensável a uma contribuição leal e dedicada.
O financiamento do ensino superior público tem sido por outro lado objecto de sucessivos cortes.
A subvenção pública às universidades em função do número de alunos – solução fácil e cómoda sob o manto insuspeito da objectividade – remete ao olvido questões essenciais destinadas a garantir a sustentabilidade do sistema.
Um regime de propinas mais aproximado do custo real de funcionamento dos cursos, apoiando naturalmente através dos mecanismos da acção social escolar quem mereça e não possa suportá-las ou encontrando formas mais imaginativas de diferir o seu custo.
Um financiamento que atenda ainda às especificidades da gestão de cada universidade e que tenha em conta a qualidade relativa dos serviços prestados – avaliando e fiscalizando o funcionamento dos cursos e premiando os melhores desempenhos.
Um esforço sério de orientação vocacional dos alunos dos graus de ensino pré-universitário por forma a ajustar a oferta formativa à procura existente e às exigências do mundo do trabalho, respeitando-se porém, pelo menos no ensino superior público, a universalidade dos saberes, de todos os saberes, cuja preservação não pode ser funcionalizada nem andar a reboque dos meros ditames do mercado de trabalho.
Assim, respeitando a autonomia universitária e a liberdade de aprender e ensinar não se prive ainda o Estado de regular, controlar e fiscalizar adequadamente o sistema de ensino superior, público e privado, actuando doravante a tempo e com justeza.
Falhada a profilaxia que a cura se revele ao menos rápida e certeira".

Rui Pedroto
*Jurista/Gestor
"O Primeiro de Janeiro"